Celebrar o sagrado, festejar o profano

30-06-2014 19:37

No calendário, Junho é o sexto mês do ano e também mês de mudança de estação, fina-se a Primavera e começa o Verão mas com ele se dá também o início da época de festas. É também Junho um mês liturgicamente rico e cheio de celebrações festivas. Em Junho, a igreja católica celebra muitos dos seus Santos, no nosso país o Anjo de Portugal no mesmo dia do feriado nacional, de permeio os Santos Populares e a terminar, os santos apóstolos Pedro e Paulo, os dois pilares fundacionais da Igreja instituída por Cristo.
No quadro destas celebrações religiosas, a tradição festiva popular levou a que a celebração do sagrado se fosse ao longo dos tempos diluindo no jeito profano de fazer a festa. E a verdade é que hoje são muitas as situações em que a festa profana se sobrepõe à celebração do Santo padroeiro.
Diz-nos Mircea Eliade em “O Sagrado e o profano- a essência das religiões” que «o sagrado e o profano constituem duas modalidades de ser no mundo, duas situações existenciais assumidas pelo homem ao longo da sua história.». Eliade adianta ainda que «estes modos de ser sagrado e profano dependem das diferentes posições que o homem conquistou no Cosmos.» Por outro lado, é um facto também que a própria igreja católica apropriou da tradição popular e das culturas dos povos evangelizados momentos festivos para instituir no calendário determinadas celebrações litúrgicas. Mas fundamental na relação e atitude do homem para com a celebração solene do Santo e na vivência da festa é que se tenha absoluta consciência do que é sagrado e do que é profano.
Não me parece de bom tom nem tão pouco justo e razoável que a celebração litúrgica do orago da terra seja simplesmente abafada pelo programa da festa profana. É que «Honrar os santos significa, antes de mais, honrar Deus Pai, o todo Santo.» (in dicionário elementar da liturgia).
É pois tempo de celebrar a devoção ao Santo predilecto com a religiosidade própria do louvor, da petição e da acção de graças; é tempo de fazer a festa em honra do Santo Padroeiro com a dignidade cerimonial da liturgia sem misturas de programa profano. Que as festas dos Santos populares sejam de enlevo espiritual, apesar da animação também necessária e própria do convívio social humano. É tempo de as festas populares de Verão se assumirem verdadeiramente na dimensão sagrada, cumprindo-se um seu programa profano em tempo diferente, isto é, não sobreposto nas horas do dia, de modo a que cada celebração aconteça no tempo e modo próprios com a dignidade específica de cada tipo de festa. Para que tal aconteça em harmonia e paz social, é também conveniente que o agendamento horário da celebração litúrgica/religiosa do Santo e programa profano da festa sejam definidos em concertação atempada pelas partes, no respeito pela ancestral religiosidade cristã e tradição do povo.
Haja animação, divirta-se o povo! Mas viva-se dignamente a fé e com alegria cristã na festa a devoção ao Espírito Santo, em louvor de Nossa Senhora ou em honra do Santo!
Alfredo Bernardo Serra