O Nosso “Senhor Vigário

17-10-2011 18:24

6 - O homem humilde e de Igreja

Quando comecei a escrever propus-me ser breve. Tarefa difícil quando teria ainda muita coisa a dizer. Não resisto a terminar sem referir um breve episódio: “Vossa Reverência pode-me confessar”? Tinha sido ordenado duas semanas antes e estava a fazer a oração de Laudes na capela do Santíssimo antes de ir concelebrar com ele a missa das oito. Aquela pergunta era-me dirigida a mim que, desde criança, me confessara tantas vezes a ele. Foi a primeira de muitas vezes que o ouvi de confissão. Admirei a sua humildade e a sua fé no valor do Sacramento da Penitência. Naquele momento eu não era o Armando do Pergulho que conhecia desde pequeno. Era o Sacerdote de Jesus Cristo de cujo perdão sentia necessidade.

Fizemos muitas actividades pastorais em conjunto e, muito naturalmente, nem sempre estávamos de acordo até porque éramos de gerações distanciadas pelo tempo. Nos últimos tempos foi até difícil estar de acordo com algumas posições e doía-me uma certa letargia em que, devido à sua idade e doença, a paróquia ia caindo. Para evitar magoá-lo, até porque com o meu temperamento impulsivo nem sempre conseguia compreender e calar-me, retirei-me e estive quatro anos a ajudar na vizinha paróquia da Sertã. Nunca estivemos de relações cortadas mas tão-somente um pouco mais afastados. Todos sabemos que a sua forma zelosa de encarar as coisas nem sempre era bem entendida por todos e a sua teimosia foi mesmo fonte de alguns conflitos. Um dia disse-lhe de caras que não estava de acordo com a forma como tinha lidado com uma determinada situação. A minha forma assertiva de dizer, nem sempre comedida, parece tê-lo magoado. Olhou-me triste e disse-me: “Olha, posso ter falhado mas a minha forma de fazer as coisas nunca foi a pensar em mim. Foi sempre para defender a Igreja”. Sempre foi isso o nosso P. Alfredo Dias: um homem mais preocupado com a Igreja que amava e servia do que consigo próprio. Fugia de honrarias e de elogios. Um dia chegou-lhe aos ouvidos que um grupo se estava a organizar para lhe prestar homenagem. Veio ter comigo e disse-me: “Soube que me querem fazer uma homenagem. Se te vierem pedir colaboração, não consintas. Senão, nesse dia eu fujo de cá. Uma homenagem? É o mesmo que estar a dar-nos “um pontapé no rabo” e a mandar-nos embora”. Mais tarde, em 1983, aceitou de bom grado a celebração pública dos seus 50 anos de sacerdócio encarando-a não como uma homenagem pessoal mas como uma homenagem ao Sacerdócio, a Jesus Cristo no qual somos sacerdotes.

Apesar dessa sua alergia a honrarias humanas, é de total justiça que hoje recordemos a sua obra e lhe dediquemos o nome de uma das ruas da nossa vila.

Proença-a-Nova, 13 de Junho de 2011

P. Armando Tavares