“A FAMÍLIA E A FÉ NA BÍBLIA”

CURSO BIBLICO EM PROENÇA-A-NOVA – DE 17 A 21 DE MARÇO

TEMA: “A FAMÍLIA E A FÉ NA BÍBLIA”                                                                                                                   RESUMO

 

Neste tempo em que não faltam tentativas de substituir o projeto de Deus por outros projetos, justificando-os com motivações filosóficas, culturais, psicológicas, sociais e até éticas, mas sempre humanas e falíveis; a Igreja quer fazer ouvir a sua voz e oferecer a sua ajuda apresentando a sua doutrina sólida, capaz de salvar a família. 

 O Papa Francisco anunciou um novo Sínodo sobre a família, a realizar em outubro de 2014 (1ª Assembleia), e em outubro de 2015 (2ª Assembleia). Já foram lançados os questionários e enviados a todas as dioceses para serem respondidos, porque a família é uma realidade humana, sujeita às transformações rápidas e profundas da sociedade; e, em cada tempo tem luzes e sombras, desafios e esperanças, próprias do tempo, do lugar e da cultura em vive. E os problemas da família de hoje, não são apenas diferentes, mas até opostos ao projeto de Deus. «Por isso, a Igreja, para cumprir a sua missão, tem de esforçar-se por conhecer as situações em que o matrimónio e a família se encontram hoje» (Família Cristã,4). Mas, só relendo, com olhos novos, o que Bíblia diz e o que a doutrina da Igreja ensina, poderemos encontrar as respostas aos problemas da família humana de hoje e de sempre.

O Projeto de Deus sobre a família

Descobrir o desígnio de Deus sobre o matrimónio e a família, perscrutando as Escrituras, é o objetivo principal do nosso estudo. Deus é Família, Deus quer a família. Desde a criação até ao fim dos tempos, o plano de Deus passa pela família humana. Desde o princípio da humanidade até hoje, a família humana anda ligada à fé num Deus criador. E desde a Incarnação do Verbo até à consumação dos séculos, a família está unida ao mistério de Jesus Cristo.

Por isso, toda a família que pretender constituir-se ou realizar-se à margem deste plano salvífico de Deus, estará profundamente fragilizada na sua realidade e, à partida, condenada ao fracasso.

O facto de a Bíblia afirmar logo na primeira página que Deus os criou homem e mulher significa que o ser humano é uma criação de Deus e não um mero produto da evolução natural. Significa ainda o seu caráter profundamente social. O ser humano foi criado para uma vida de relação. Os textos de Gn 1,26-28 e 2,7.18-24 sobre a criação do homem e da mulher na Bíblia são os que fornecem os dados mais diretos para a teologia bíblica do matrimónio no Antigo Testamento. Segundo estes textos, no plano criador de Deus, a família é constituída pelo homem, pela mulher, unidos numa comunhão de amor, iguais em direitos e deveres, e pela fecundidade que se manifesta nos filhos. A família é essencialmente relação, horizontal: homem-mulher, e relação vertical: pais e filhos. Mais, a família e somente a família, é a imagem mais perfeita possível de Deus, sobre a terra. É na família e em família que os seres humanos atingem o maior grau de perfeição.

A ideia de serem “imagem de Deus”, está ainda ligada à ideia de serem eles os interlocutores capazes do diálogo com Deus. Esta ideia está também intimamente ligada à ideia de Aliança de Deus com o seu Povo. Os profetas utilizam muito a imagem esponsal para exprimir as relações de Aliança de Deus com Israel; e vice-versa, falam da infidelidade matrimonial para retratar a infidelidade do Povo ao Deus da Aliança.

A nova família nos Evangelhos

O Evangelho representa um salto qualitativo em relação ao Antigo Testamento também no  que diz respeito à família. A fecundidade biológica dá lugar a outro tipo de fecundidade em relação ao Reino; os laços de sangue são secundarizados em relação ao amor pelo Reino.

 Deus vem ao mundo numa família, semelhante a qualquer outra (Mt 1-2; Lc 1-2): Essa família é a continuação das famílias patriarcais do Antigo Testamento, como nos contam as genealogias (Mt 1,1-17; Lc 3,23-38). Mas diferente: José, é o pai adotivo de Jesus, que o torna o Filho do carpinteiro. Maria, é a Virgem que O concebeu pela ação do Espírito Santo (Lc 1,26). A nova família é constituída pelos que escutam a Palavra e fazem a vontade de Deus (Mc 3,31-35; Mt 12, 46-50; Lc 8,19-21). As relações familiares também mudam: da consanguinidade para a escuta da Palavra. A família célula da sociedade, torna-se lugar teológico da realização do novo Reino. A nova família sem rejeitar os laços de sangue, encontra o seu centro e ponto de apoio na Palavra de Deus.

Jesus não é contra a família fundada na consanguinidade, mas ultrapassa-a, porque a nova família tem valor absoluto. Nesta família há lugar para o celibato e a virgindade: os eunucos por amor ao Reino” (Mt 19,10-12;Lc 18,29-30;Cor 7-8.27).E o matrimónio é integrado, nesta nova família, como sinal eficaz( sacramento) do novo Reino.

A família em S. Paulo

S. Paulo é o autor do Novo Testamento que mais elementos oferece sobre o matrimónio cristão. Não tem um tratado teológico sobre o matrimónio. Apresenta apenas algumas diretrizes pastorais e ideias teológicas sobre o assunto, pedidas pelas comunidades cristãs do seu tempo.

Todo o pensamento de Paulo arranca da sua fé na ressurreição. Dentro da sociedade em que os seus cristãos estão inseridos propõe normas de conduta que se ajustem à sua condição de criaturas novas, em Cristo. As suas orientações têm, por base, a conceção que os crentes inseridos em Cristo, vivem já a realidade escatológica, onde todas as diferenças são abolidas. Por isso recomenda aos cristãos que permaneçam no estado em que se encontram, célibes ou casados.

Paulo, não opõe virgindade e casamento, mas defende os dois e aprova a união física como manifestação normal do amor e até fala da obrigação do marido e da mulher em cumprirem o seu dever conjugal de um para com o outro. “Não vos recuseis um ao outro, a não ser de mútuo acordo (1 Cor 7,3-5).

Mas Paulo vai mais longe, a relação homem-mulher casados tem o seu modelo perfeito na relação Cristo (esposo)- Igreja (esposa), a que ele chama grande mistério ( Ef 5,21-33).

Apesar de tudo isto continua a haver uma ideia preconceituosa e de desconfiança sobre a doutrina de Paulo e, até da Igreja, sobre o matrimónio.

É urgente evangelizar o mundo conjugal e familiar, mas para isso é imperioso começar por evangelizar as nossas ideias.

A expressão mais bonita para falar da nossa relação com Deus ainda é a metáfora do matrimónio. O amor exprime o mais profundo da relação do ser humano. Cada um de nós está casado com Deus, (e oxalá esteja bem casado), e Deus connosco.

A família na História da Igreja

A vida nova inaugurada por Jesus Cristo precisou de tempo para se consolidar e chegar a todas as realidades humanas. Os primeiros cristãos não falavam nem pensavam em Sacramento do matrimónio no sentido que lhe damos hoje. Os primeiros cristãos continuam a viver o matrimónio segundo as suas tradições judaicas, mas na perspetiva do Reino de Deus, anunciado por Jesus Cristo. No casamento não havia nenhuma celebração religiosa. O esposo vai buscar a esposa e leva-a para casa. A esposa passa de uma submissão ao pai a uma submissão quase total ao esposo. (Caderno Bíblico: A Palestina no tempo de Cristo, nº 41). Com o andar dos tempos o casamento segue as tradições familiares e as leis da cidade. «Os cristãos não se distinguem dos outros… casam-se como toda a gente; têm filhos, mas não abandonam os recém-nascidos…São de carne mas não vivem segundo a carne. Vivem na terra, mas como cidadãos do céu.» (Carta a Diognetes, sec. II) . Mas, entre os cristãos a fidelidade é fundamental e de tal modo valorizada que o segundo casamento, por viuvez, é visto com uma certa desconfiança. (1Tm 5,3-14).

Com S. Agostinho o casamento passou a ser considerado como um mal menor. Embora maculado pelo desejo carnal é um valor quando se subordina a um bem superior: a procriação. O casal é esquecido, mas tem um valor ao apontar o perigo de ver o matrimónio centrado na busca do prazer e pelo prazer, fechando a porta a toda a dimensão espiritual e abertura ao transcendente.

Na idade média, o poder civil perde terreno a favor da autoridade eclesiástica. Esta vai exigindo ter uma palavra, nos matrimónios dos cristãos, ao ponto de afirmar que é pelo consentimento público dos esposos, diante da Igreja, na presença dum sacerdote, que os esposos participam na Graça divina.

Mas é só no século XVI, no Concílio de Trento que se define, contra Lutero, que o matrimónio é declarado sacramento: «Jesus deu um sentido novo a esta união e fez dela um manancial de graça e a Igreja é a responsável pela comunicação desta graça.»  Após um período de cristandade, em que a Igreja geria o direito matrimonial, a sociedade civil, introduziu o matrimónio civil, com o propósito de tirar à igreja esse poder mesmo em relação aos crentes.

Hoje a situação alterou-se: Para os cristãos, a Igreja reconhece como válido só o casamento, sacramento, conforme as suas normas, mas admite que os batizados que não têm fé possam celebrar o seu casamento, pelo civil.

A Família depois do Concílio Vaticano II

O concílio Vaticano II na Constituição Dogmática sobre a Igreja no mundo contemporâneo (GS), dedica todo um capítulo à dignidade do matrimónio e da família, desenvolvendo os seguintes aspetos: O matrimónio tem como centro o amor mútuo entre homem e mulher, mútua entrega de pessoas. Essa comunidade de amor desenrola-se em duas dimensões: mútua entrega de duas pessoas que se ajudam e sustentam mutuamente; ordenada pela sua própria natureza à procriação e educação da prole. Uma comunidade que se fundamenta em “uma aliança de cônjuges, que supõe “fidelidade conjugal e unidade indissolúvel”.

O matrimónio não se reduz a um frio contrato, mas é uma aliança ou entrega mútua de amor que, celebrada na fé cristã, é um sacramento. O matrimónio sacramento deve fomentar a “perpétua fidelidade, como é perpétua a entrega de Deus, em Jesus Cristo, à Igreja. Vivificados pela graça para a vida de santidade, os esposos serão intérpretes desse amor de Deus.

Em 1980 houve um Sínodo que tratou especificamente mais uma vez, este tema da Família cristã, que depois, o Papa João Paulo II, em 1981 recolheu na exortação apostólica:  “Familiaris Consortio” (Família cristã). Nesta exortação, o Papa dá importância sobretudo aos deveres da Família cristã que ele resume em 4 capítulos, a saber: A formação da comunidade de pessoas; o serviço da vida; a participação no desenvolvimento da sociedade; a participação na vida e na missão da Igreja.

Portanto, entre os deveres fundamentais da família cristã o Papa sublinha a sua participação na vida e na missão da Igreja: acolhendo e anunciando a Palavra de Deus; dando uma educação cristã aos filhos e preparando-os para, também eles, receberem dignamente o sacramento do matrimónio. A família cristã deve ser um lugar onde se transmite o evangelho e donde o Evangelho irradia (Evangelii Nuntiandi).

O futuro da Humanidade passa pela família

O bom fruto desta semana depende de todos. Por isso, ao terminar, fazemos nosso, o apelo de João Paulo II ao concluir a sua exortação “Família cristã (Familiaris consortio): «A vós, esposos; pais e mães de família; a vós, jovens, que sois o futuro e a esperança da Igreja e do Mundo e os responsáveis pela família no terceiro milénio; a vós, religiosos e religiosas, almas consagradas ao Senhor, que testemunhais aos esposos a realidade última do amor de Deus.

A vós todos que tendes o coração reto, que por motivações diversas vos preocupais com a situação da família, a vós todos se dirige o meu apelo final: é indispensável e urgente que cada homem de boa vontade se empenhe em salvar e promover os valores e exigências da família, porque o futuro da Humanidade passa pela família» (FC, exortação final).

Frei Manuel